Monteiro Lobato

As aventuras de Hans Staden

 Capítulos 11 e 12

 

11 – O francês sem coração

         Um dia surge um selvagem pela cabana de Hans adentro, gritando:

         – Está cá o francês mercador de pimenta; vamos verificar se és da mesma raça dele ou não.

         O pobre artilheiro exultou de contentamento. Era um cristão que vinha ao seu encontro e que fatalmente o salvaria. Apressou-se, portanto, em comparecer à presença daquele juiz que lhe caía do céu.

         Essa entrevista, meus filhos, é uma cena de tragédia das mais empolgantes. Quem a figura na imaginação não a esquece nunca mais.

         Os selvagens levaram-no à presença do francês, nu como ele andava, tendo apenas nos ombros um pano de linho que achara na aldeia.

         O mercador de pimenta dirigiu-lhe a palavra em francês. Hans, que mal conhecia essa língua, atrapalhou-se nas respostas. O monstro, então, voltou-se para os selvagens e disse-lhes em língua da terra:

         – É português dos legítimos, meu e vosso inimigo. Matai-o e comei-o! Continue lendo “Monteiro Lobato”

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Monteiro Lobato

As Aventuras de Hans Staden

Capítulos 9 e 10

 

09 – Rumo à taba

         A captura de Hans – continuou Dona Benta – deu-se ali pelas quatro horas da tarde, e como a taba fosse longe, resolveram os tupinambás dormir numa ilhota do caminho. Saltaram das canoas e as vararam em terra.

         O pobre artilheiro achava-se em mísero estado; além de nada enxergar, pois tinha o rosto em sangue, não podia mover-se, devido ao ferimento da perna. Assim é que ficou deitado na areia, enquanto os índios preparavam o pouso. Naquela imensa aflição pôs-se a rezar um salmo, com os olhos em pranto. Ao vê-lo nesse estado, os índios escarneceram.

         – Vede como chora! Ouvi como se lamenta!

         Em transes idênticos os prisioneiros indígenas mostravam grande arrogância e profundo desprezo pela vida; arrostavam os seus matadores, ameaçando-os com a vingança dos amigos e parentes. Os brancos, porém, em geral se acovardavam, choravam e pediam misericórdia.

         Os tupinambás acenderam fogueiras e deitaram o prisioneiro numa rede armada entre duas árvores, atando aos galhos as pontas das cordas manietadoras. Depois se acomodaram em redor, exclamando com ironia:

         – Che remimbaba indé. – És meu animal doméstico. Continue lendo “Monteiro Lobato”

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As aventuras de Hans Staden

Capítulos 7 e 8

 

07 – O forte de Bertioga

         Hans Staden ficou em São Vicente, colônia portuguesa situada numa ilha muito próxima do continente e que contava dois povoados: o de São Vicente, chamado pelos índios Ipanema  (1), e outro de nome Enguaguaçu (2). Havia ainda pela ilha vários engenhos de açúcar.

         Os índios dessa região eram os tupiniquins, cujos domínios se limitavam ao sul com a terra dos carijós, e ao norte com a dos tupinambás, tribos inimigas entre si.

         Os tupinambás odiavam aos portugueses por se terem aliado aos tupiniquins, e como a cinco milhas de São Vicente ficasse Bertioga 3, onde havia um canal de fácil entrada às suas canoas, um grupo de irmãos mamelucos, lá residentes, tratou de erguer ali um forte. Era o meio de proteger contra as incursões desses índios as lavouras que começavam a formar-se nos arredores.

         – Que é mameluco? Continue lendo “Monteiro Lobato”

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