CONTA OUTRA VÓ 08. O FIGO DA FIGUEIRA

o figo da figueira

desenho de Ricardo Garanhani 

Nota: Esta historinha parece pertencer ao folclore nacional. Lembro de tê-la lido diversas vezes, quase sempre em versão semelhante à de minha avó. No livro Histórias de tia Nastácia, de Monteiro Lobato, é a nona história. Nessa versão, são três as filhas que, ao serem desenterradas, voltam à vida, pois eram afilhadas de Nossa Senhora. Outro dado curioso em Lobato é que o vento, ao bater no capim crescido no local onde as meninas estavam enterradas, faz com que as plantas cantem a mesma canção com que elas tentavam espantar os passarinhos. Isto faz lembrar a lenda grega das orelhas do rei Midas, cujo resumo apresento no final desta história.

          Era uma vez um viúvo que tinha uma linda filhinha. Viviam no campo e em volta da casa deles cresciam muitas árvores enormes, mangueiras, laranjeiras, jabuticabeiras, abacateiros, mamoeiros e figueiras.

          Eles viviam muito bem mas o homem não conseguia cuidar direito da menina porque ele não sabia cozinhar e lavar a roupa e arrumar a casa e tiveram que arranjar uma empregada.

          Aí apareceu uma mulher cheia de dengues, que começou a cativar a pequenina. O viúvo gostou dela e acabaram se casando. Ah!, mas o quanto ela era boa, no começo, ela era ruim, depois. Maltratava a menina, ensinava a ela o serviço de casa e exigia obediência.

          O pai, que trabalhava fora todo o dia, não percebia nada. E a pobre menina não tinha coragem de contar o que estava acontecendo.

          Acabou que ela ficou com todo o serviço da casa. Lavava e passava e varria e cuidava. A madrasta só queria ficar na varanda, de leque na mão e comendo figos, que ela adorava.

          Certa vez o pai precisou viajar. Disse que ia demorar muito. A madrasta judiou mais da menina e para lhe dar um trabalho bem difícil, colocou-a vigiando uma enorme figueira, para que os passarinhos não bicassem nenhum figo.

          Ela vigiou muito tempo, espantando os bichinhos, mas quantos eram eles? Ela fez um espantalho e não adiantou. Arranjou uma vara comprida e ficava rodeando a figueira mas eles voavam e cantavam e ela ficou cansada e se distraiu e um passarinho mordeu um figo maduro.

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canção 13. agora e sempre

A ditadura da burrice 08: AGORA E SEMPRE

O pai, junto à hetaíra, comenta:
Ele merecia esta sorte.
A mãe, dedilhando a lira, lamenta:
Ele mesmo buscou tal morte.
O filho, acendendo a pira, proclama:
Não é bom criar problema.
O avô, copiando a Ilíada, exclama:
Não se deve contrariar
o sistema.

E Sócrates bebeu a cicuta.
Lá fora o povo aplaudia.
Sim, Sócrates bebeu a cicuta.
Afinal, isto não ocorre todo dia.

O pai, a contar denários, comenta:
Ele merecia esta sorte.
A mãe, a tecer sudários, lamenta:
Ele mesmo buscou tal morte.
O filho, a roubar dromedários, proclama:
Não é bom criar problema.
O avô, compondo a parábola, exclama:
Não se deve contrariar
o sistema.

E Cristo foi pregado à cruz.
Lá embaixo o povo aplaudia.
Sim, Cristo foi pregado à cruz.
Afinal, isto não ocorre todo dia.

O pai, a erigir papados, comenta:
Ele merecia esta sorte.
A mãe, a trançar bordados, lamenta:
Ele mesmo buscou tal morte.
O filho, a quebrar tratados, proclama:
Não é bom criar problema.
O avô, ensinando a Escolástica, exclama:
Não se deve contrariar
o sistema.

E Giordano Bruno foi queimado,
Ao redor, o povo aplaudia.
Sim, Giordano Bruno foi queimado,
Afinal, isto não ocorre todo dia.

O pai, a erguer capelas, comenta:
Ele merecia esta sorte.
A mãe, a mexer gamelas, lamenta:
Ele mesmo buscou tal morte.
O filho, a enganar donzelas, proclama:
Não é bom criar problema.
O avô, lendo o verso arcádico, exclama:
Não se deve contrariar
o sistema.

E Tiradentes foi enforcado,
Em volta o povo aplaudia.
Sim, Tiradentes foi enforcado,
Afinal, isto não ocorre todo dia.

O pai, a esconder falências, comenta:
Ele merecia esta sorte.
A mãe, a exigir decências, lamenta:
Ele mesmo buscou tal morte.
O filho, a viver carências, proclama:
Não é bom criar problema.
O avô, diante da Estatística, exclama:
Não se deve contrariar
o sistema.

Era eu, ou você, ou ele ou nós.
E a gente achando que entendia.
Sim, era eu, você, e ele e nós.
Afinal, isto nos ocorre todo dia.

 

(canta jorge teles)

Curitiba, 29.11.1977

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canção 12. minueto do cocozinho teimoso

Canções Diversas 09: MINUETO DO COCOZINHO TEIMOSO.

Cançãozinha feita para meus dois filhos.

Cocozinho teimoso,
já chegou tua hora;
eu puxei a descarga,
você não foi embora.
Você vai lá pro fundo,
fica escondidinho;
quando eu menos espero,
você volta inteirinho.

Cocozinho teimoso,
estou sem paciência.
Tô ficando irritado
com a sua insistência.
Você dá cambalhotas
que nem um palhacinho;
quando eu menos espero,
você volta inteirinho.

Cocozinho teimoso,
estou muito zangado;
joguei um balde d’água
e eis o resultado:
você desaparece,
eu me vejo sozinho;
quando eu menos espero,
você volta inteirinho.

Eu peguei uma faca
e cortei-o ao meio.
Dei de novo a descarga
pra atingi-lo em cheio.
Mas eu levei um susto
com o que vi depois.
Era um cocozinho.
E agora são dois.

 

(canta Isabela Teles)

Curitiba, 28.06.1982

 

 

 

 

 

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