Resumo:
O próprio Autor se apresenta como Prólogo. Esteve doente e conta as engraçadíssimas visões que teve durante a febre, citando famosas mulheres em cenas corriqueiras e ridículas. Anuncia que o palácio virou um Templo de Apolo. Apolo gostaria de reformar o mundo e apresenta algumas idéias, ridicularizando os padres. Na frente do templo é colocado um Porteiro, que deve impedir a entrada daqueles que não são dignos do Imperador Carlos V e de sua mulher, Isabel, filha de Dom Manuel e irmã do rei português Dom João III. Em pares, chegam os Romeiros para a visitação ao Templo. São alegorias diversas dos servidores do Imperador. Entram o Mundo e a Flor da Gentileza. Depois Vencimento e Virtuosa Fama. A seguir o Cetro Onipotente e a Prudente Gravidade. E o Tempo Glorioso e a Honesta Sabedoria. Oram, pedindo favores para o Imperador e sua mulher. Vem um plebeu português, rústico. Desentende-se com o Porteiro, que não o quer deixar entrar. Vem Apolo e logo a seguir os outros Romeiros. Todos cantam e dançam em homenagem à Imperatriz.
GV093. Dois Romeiros
Gloriosa gloria mia,
Vos seais muy bien venida;
Pues con vos vive la vida,
Tiempo es de mi alegria.
(cantam Gerson Marchiori e Rubem Ferreira Jr)
GV094. Vilão
Rogaré á Dios del cielo
Que era padre de mesura,
Que ou me case ou me mate,
Ou me tire de tristura.
Amor no puedo dormir.
(canta Jorge Teles)
Gv095. Romeiros
Pardeos, bem andou Castella,
Pois tem Rainha tão bella.
Muito bem andou Castella
E todos os Castelhanos,
Pois tem Rainha tão bella,
Senhora de los Romanos.
Pardeos, bem andou Castella
Com toda sua Hespanha,
Pois tem Rainha tão bella,
Imperatriz d’Allemanha.
Muito bem andou Castella,
Navarra e Aragão,
Pois tem Rainha tão bella,
E Duqueza de Milão.
Pardeos bem andou Castella
E Sicilia tambem,
Pois tem Rainha tão bella,
Conquista de Jerusalem.
Muito bem andou Castella,
E Navarra não lhe pesa,
Pois tem Rainha tão bella,
E de Frandes he Duqueza.
Pardeos bem andou Castella,
Napoles e sua fronteira,
Pois tem Rainha tão bella,
França sua prisioneira.
(cantam Graciano Santos e Rubem Ferreira Jr)
GV096. Apolo
Águila, que dió tal vuelo,
Tambien volará al cielo.
Águila del bel volar
Voló la tierra y la mar:
Pues tan alto fue á posar
De un vuelo,
Tambien volará al cielo.
Águila una Señora
Muy graciosa voladera,
Si mas alto bien hubiera
En el suelo,
Todo llevara de vuelo.
Voló el águila real
Al trono imperial,
Porque le era natural,
Solo de um vuelo,
Subirse al mas alto cielo.
(canta Gerson Marchiori)
Comentário:
Peça, como tantas outras, encomendada para uma ocasião específica, no caso a partida de Isabel, filha de D. Manuel, para a Espanha, onde se casaria com Carlos V. O início da peça é cômico mas a solenidade das falas dos Romeiros-Alegorias dão à obra um caráter de chatice oficial. A entrada do rústico devolve-lhe o sabor, até porque os textos das canções são brilhantes.
Observa-se que, para certas festividades, Gil Vicente era encarregado de criar um teatro mais superficial, sem enredo; apenas uma situação que permitisse fazer os elogios aos nobres portugueses a quem era dedicada a apresentação. Isto aconteceu com As Cortes de Júpiter e, agora, com este Templo de Apolo. A escolha do maravilhoso pagão permite que o clima da festa seja feérico, figurinos certamente exuberantes e textos bajuladores.
As duas canções fazem a exaltação à princesa Isabel, imperatriz após o casamento com Carlos V. Com toda certeza, foram feitas especialmente para a ocasião.