Camões: Ao desconcerto do mundo

Canções de texto alheio 01:
AO DESCONCERTO DO MUNDO
Luís Vaz de Camões


Os bons vi sempre passar
No mundo graves tormentos;
E para mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.

Cuidando alcançar assim
O bem tão mal ordenado,
Fui mau, mas fui castigado.
Assim que, só para mim,
Anda o mundo concertado.

Curitiba, 1980.
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pombinha branca

Canções diversas, 14: POMBINHA BRANCA


Pombinha branca
fuja do laço
do caçador.
Que eu também quero
fugir do abraço
do meu amor.

Seu beijo arrebata
e mata de paixão.
Amor que mata
eu não quero, não.
Amor que mata
eu não quero, não.

Você tem asas
e, no perigo,
pode voar.
Mas eu não tenho
e por castigo
vivo a chorar.

O olhar dele maltrata,
dá um nó no coração.
Amor que mata
eu não quero, não.
Amor que mata
eu não quero, não.

Campo Largo, 06.2008.

(canta Carmen Ziege)
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curitiba, curitiba

Canções diversas 11: CURITIBA, CURITIBA. 
Eu quero, agora, cantar Curitiba,
cidade branca, limpa e sandia,
pedindo à Musa que me não proíba.
 
Quero cantar miséria e alegria,
munido de poética coragem
e equipado de inspirada ousadia.
 
Começo, então, essa minha viagem
procurando arrolar seus disparates,
o seu trabalho e sua vadiagem.
 
Rua das Flores, dolés, chocolates,
cafés e churros. Todos misturados,
estelionatários e engraxates,
 
mendigos, bichas loucas, advogados,
confusão de inquietos e teimosos,
de ofendidos e de humilhados.
 
Boca Maldita, encontro de ociosos
com o linguajar ferino criticando,
mas sem nada assumir, de tão medrosos.
 
Batel, com suas bruxas convidando
outras bruxas pros chás beneficentes,
e o jornalista idiota, publicando
 
suas recepções e seus presentes,
suas viagens pela Argentina,
seus filhos belos, vis e delinqüentes.
 
Enquanto as filhas, diante da vitrina
discutem de vestidos dispensáveis
pra debutar a vaidade cretina.
 
Nas marechais, políticos vendáveis,
executivos, ladrões, contadores,
corruptos, banqueiros execráveis,
 
subornos, mordomias, mil horrores,
tudo de acordo com a justiça cega
e a proteção dos desembargadores.
 
E o dinheiro secreto escorrega
pros cofres da canalha protetora
que despoja, assassina e sonega.
 
Rua Riachuelo, a domadora
provocando o passante com o convite
em troca da moeda enganadora.
 
Sede das pragas mil de Afrodite,
fome e dor simuladas e escondidas,
nas máscaras de um prazer sem limite.
 
Madrugadas eternas e sofridas,
batidas, cassetetes, frio e sono,
té que o sol afugente as desvalidas.
 
Passeio Público, o filho sem dono,
filho que é só filho da empregada
mal paga pela mãe do abandono.
 
Na areia a criança é negligenciada
enquanto a pobre moça fica à espera
do soldadinho que está de emboscada.
 
Nas áreas verdes, a alegria austera
dos papais e mamães endomingados
que a TV anunciou a primavera.
 
Em volta disso tudo, os amontoados
de cães, caixotes, latas, ferro velho,
lixo e alguns casebres definhados;
 
as roupas com remendos no joelho,
nas panelas só cabeças de bagre,
os bens aventurados do evangelho.
 
Filhos do fel diário e do vinagre,
disputando o diabólico pão:
sustentáculos do podre milagre.
 
Guabirotuba, Xaxim, Boqueirão,
Abranches, Oficinas, Barigüi,
Pinheirinho, Los Angeles, Portão,
 
Juvevê, Vila América, Tingüi,
Uberaba, Boa Vista, Cajuru,
Barreirinha, Cabral, Bacacheri,
 
Bigorrilho, Água Verde e Ahu,
Alto da Quinze, Mercês e Taboão.
Curitiba, querida, I love you.
 
Curitiba, 05.08.1980.
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