GIL VICENTE 38. ROMAGEM DOS AGRAVADOS (1533)

Resumo:

Entra o Frei Paço, que de Frei só tem o hábito. Vive no palácio, deixou crescer o cabelo no lugar da coroa careca e gosta de usar a espada, como um nobre. “E posso me gabar que invejar, mexericar, são meus salmos de David que costumo de rezar”. Apresenta a romaria dos agravados, pessoas que se sentem injustiçadas e oprimidas.. Um rústico está descontente com Deus que sempre manda chuvas e sol em horas erradas, destruindo suas colheitas. Quer fazer do filho um padre para que este não sofra tanto. Vêm a seguir dois jovens apaixonados. Duas vendedoras fazem a romaria porque um rapaz enganou-as, casando-se com a sobrinha sem ter a situação que alardeava. Um nobre reclama da pensão real. Um Frei está descontente porque não recebeu o seu bispado. Um camponês vem com a filha. Reclama que os frades, a quem serve, tudo lhe tiram. Pede ao Frei Paço para que ensine à moça as boas maneiras da corte, para que ela melhore de posição social. A seguir são duas freiras que reclamam do rigor da clausura, pois até para conversar com parentes, apenas mulheres, ficam escondidas, sem vê-las. Duas pastoras não aceitam os casamentos que lhes foram destinados e trocam idéia sobre a maneira de evitar as bodas: uma vai dizer que teve uma visão, anunciando perigos no casamento programado; a outra dirá que consultou um feiticeiro e este avisou que se ela se casasse com aquele prometido, ficaria endemoniada. Frei Paço dá a palavra final: “Agravos que não têm cura procurai de os esquecer; qu’impossível é vencer batalha contra ventura, quem ventura não tiver”. Anuncia que a Rainha teve um filho e que todos devem cantar em homenagem ao menino, dom Felipe.

GV130. Branca e Marta

Mor Gonçalves,
Tão mal que m’encarcelastes
Nos Paços d’ElRei,
E na camara da Rainha,
Du bailava ElRei,
E con Dona Catherina,
Mor Gonçalves,
E tão mal que m’encarcelastes.

(canta Jorge Teles)

GV131. Todos

Por Maio era por Maio
Ocho dias por andar,
El Ifante Don Felipe
Nació en Evora ciudad.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las aguas del mar.

El Ifante Don Felipe
Nació en Evora ciudad,
No nació en noche escura,
Ni tanpoco por lunar.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las ondas del mar.

No nació en noche escura
Ni tanpoco por lunar,
Nació cuando el sol decrina
Sus rayos sobre la mar.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las aguas del mar.

Nació cuando el sol decrina
Sus rayos sobre la mar,
En un dia de domingo,
Domingo para notar.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las ondas del mar.

En un dia de domingo,
Domingo para notar,
Cuando las aves cantaban
Cada una su cantar.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como la tierra y la mar.

Cuando las aves cantaban
Cada una su cantar,
Cuando los árboles verdes
Sus fructos quieren pintar.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las aguas del mar.

Cuando los árboles verdes
Sus fructos quieren pintar
Alumbró Dios á la Reina
Con su fructo natural.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las aguas del mar.

(cantam Graciano Santos, Rubem Ferreira Jr e Kátia Santos)

 

Comentário:

Aqui temos um Gil Vicente num de seus mais característicos momentos: o fazer desfilar figuras típicas de seu tempo. Deve ser esta a peça que mais apresenta peculiaridades sobre a sociedade daquela época. Exploração social, oportunismos, falsidades, a possibilidade de ascensão para mulheres jovens e bonitas, casamentos organizados pelas famílias. Nalguns aspectos Gil Vicente, sem nenhum mérito, é claro, é atualíssimo. Aliás, ressalte-se que algumas renvindicações já existiam naquele tempo: a liberdade de escolher marido e o excessivo rigor do claustro.
Como sempre, as críticas a práticas daninhas à sociedade, aparecem claras e contundentes. Quando as tias da moça enganada explicam como o noivo da sobrinha as enganou, enumeram pessoas do palácio que davam, sem o conhecimento do rei, documentos falsos, para indicar que o portador gozava de benefícios como uma pensão real.
A cena do exercício de comportamento palaciano entre a Moça e o Frei Paço é inesquecível. O texto específico da canção final indica que a mesma, com certeza, foi feita pelo autor.

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