trilogia cética 01. missa sacratíssima

MISSA SACRATÍSSIMA

 

Introitus

Fechem-se todos os livros sagrados!
Calem-se todos os sacerdotes!
Apaguem-se as luzes dos sacrários!
Que se derrame nos ladrilhos do chão consagrado
as águas abençoadas!
Cubra-se os santos com os panos negros!
Esvazie-se o trono santificado!
Aos cães e porcos as oferendas
e que se lacrem os portões de todos os templos!
Silêncio!, cânticos que querem ofender
os ouvidos divinos!
Sosseguem!, pernas que querem dançar
as danças propiciatórias!
Suspensas as lâminas dos sacrifícios!
Pão da fome passageira
e vinho da pequena embriaguês!

Quieto, tudo!

Silêncio, todos!

Parem!

Não é verdade que o homem vem fazendo
deuses à sua imagem?
Teço, eu, então, agora, a imagem
do meu novo deus!
Que seja mais do que à minha imagem!
Mas à imagem do Homem!
Sacratíssima pretensão!
Sacratíssima ousadia!
Sacratíssima humildade!
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CONTA OUTRA VÓ 02. A SANDÁLIA

a sandália

 

 (ilustração de Ricardo Garanhani)

Nota: No início dos anos 70 li o Decameron de Boccaccio. A quarta novela da sétima jornada me fez lembrar de uma das historinhas que minha avó contava. Havia variações quanto a local e detalhes mas a essência era a mesma. Fiquei pensando em outras histórias de minha avó, analfabeta. Fiz um levantamento de todas, ela contava e recontava a cada vez que pedíamos. Percebi que nas minhas leituras nunca tinha encontrado algumas daquelas histórias. E resolvi anotar todas, para não esquecê-las. O resultado foi esse Conta outra, vó. A Sandália, o segundo conto, é a variante encontrada no Decameron. 

    Era uma vez uma vez uma mulher muito linda. Era casada com um fazendeiro rico e tinham muitos escravos. Isto aconteceu quando o Brasil ainda tinha escravos negros.

    Certa feita apareceu um mascate cheio de novidades e a mulher comprou um lenço. Quando entrou no quarto e abriu o lenço pra enrolar nos cabelos, caiu um anel de rubi. Ela guardou o anel e quando ele voltou, dias depois, disse que o anel estava escondido dentro do lenço. Ele pegou o anel e olhou ela de um jeito muito especial e ela estremeceu inteirinha.

    Um mês depois ele voltou e ela comprou uma caixinha de jóias. Ele disse que ia embrulhar e ela não quis, mas ele tanto fez que ela consentiu. Ela entrou pro quarto e daí a pouco uma escrava veio com o pacote. A mulher estava cheia de aflição.

    Pois não é que o sem-vergonha tinha colocado um bilhetinho no porta-jóias? “Quero me encontrar com a senhora num lugar escondido.”

   A mulher não quis receber o mascate quando ele voltou, disse que não precisava de nada. Mas à noite o fazendeiro falou na janta que tinha empregado ele na fazenda, que ele ia fazer serviços de carpintaria. Ela ficou cheia de medo mas não falou nada.

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RAKONTU ALIAN ANJO 01. – FRAŬLINO MARINJO, MI VIN MANĜ’MANĜ’!

fraulino marinho

(desegnis Ricardo Garanhani)

    Foje, estis maljuna fraŭlino nomata Marinjo. Ŝi estis fraŭlino ĉar ŝi rifuzis ĉiujn prezentiĝintajn svatiĝantojn. Kiam ŝi decidis edziniĝi, ili ne plu volis ŝin, ĉar ŝi jam maljunuliĝis.

     Tiam, maljunaj fraŭlinoj loĝis ĉe siaj gepatroj. Ili brodis kaj kudris. Ili helpis je la hejmlaboroj. Sed tiu preciza Fraŭlino Marinjo ne havis patron. Nek patrinon. Nek fraton. Onklon aŭ onklinon ŝi ne havis. Eĉ ŝia baptopatro jam mortis kaj pri baptopatrino ŝi memoris absolute nenion. Pro tio loĝis ŝi tute sola kaj ŝia nura akompananto estis hundineto tre ruza.

     Fraŭlino Marinjo estis tre timema. Je la alveno de la nokto, ŝi fermis la pordon per stango kaj estingis la kandelon. Ŝi loĝis en malproksima domo. Je la alveno de la mateno, ŝi ne plu timis.

     Iuvespere, oni frapis je la pordo, tok-tok.

     Fraŭlino Marinjo kuntiriĝis pro timo.

     Oni frapis denove, tok-tok.

     Ŝi ne respondis, muteta kiel nur ŝi mem.

     Oni frapis laste, tok-tok. Kaj vira voĉo kriis de ekstere: Continue lendo “RAKONTU ALIAN ANJO 01. – FRAŬLINO MARINJO, MI VIN MANĜ’MANĜ’!”

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