GIL VICENTE 43. AUTO DA FESTA (1535)

a velha

Resumo:

A Verdade reclama porque está sendo maltratada em Portugal. Após sua apresentação, senta-se num canto e passa a assistir o que virá a seguir. Um Vilão pede-lhe conselhos porque está cometendo adultério com a mulher do Juiz e foi levado à justiça. Diz que há consentimento da mulher. A Verdade lhe diz: “Não te quero aconselhar porque teu mal não tem cura… encomenda-te à ventura, que ela te-há de guiar”. Duas ciganas falam a sorte de algumas pessoas, pedindo presentes. Quando elas pedem prendas à Verdade, esta revela seu nome e as expulsa. Uma cigana joga uma praga na Verdade. “…que ás de andar arrastrada mientras la vida durar”. Um Parvo procura a porquinha de sua patroa. Um Rústico tem com o Parvo o mesmo diálogo já mostrado em Templo de Apolo entre o Rústico e o deus. Vem a Velha, mãe do Parvo, ralhando com ele e maldizendo. Um jovem faz a corte à Velha. Ela, coquete, finge não aceitar. Até Gil Vicente, diz ela, o que faz os autos para o rei, já a pediu. Logo porém ela começa a fazer o casamento mas quando ela diz seu nome, ele se recusa, por serem parentes. Ela sai para conseguir uma “absolvição”, um tipo de autorização da Igreja. Ele foge. Volta a Velha, vestida de noiva, com a autorização. O Rústico reaparece e diz que se casará com a Velha, mas desaparece a seguir. Três pastoras e um pastor cumprimentam o senhor da casa e termina a peça.

GV139. Lucinda e Graciana

San Iu verde passó por aqui;
Quan garridico lo vi venir.

(canta Jorge Teles)

GV140. Parvo

De so la giesta
Dormiré la sesta.

(canta Jorge Teles)

 

Comentário:

Penúltima peça de Gil Vicente. Mais uma vez o autor usa da sua pena para aguilhoar sua gente “Quem quiser ter de comer, que nunca fale a verdade”. A Verdade desempenha aqui um papel mais de espectadora das cenas. As cenas não são muito lógicas e o final é meio confuso, por causa das duas últimas falas da Velha. Não fica claro se é um delírio da coitada, sobre o qual os presentes fazem chacota! Há na figura da Velha algo do tragicômico chapliniano e isto já tinha sido mostrado na peça Triunfo de Inverno, quando uma outra Velha é obrigada pelo namorado a subir uma serra descalça, em plena neve.
É mencionado que esta peça foi encenada “porventura” em casa do ilustrado Conde de Vimioso. Seria este nobre tão importante ou estaria Gil Vicente perdendo o seu prestígio?

Visitas: 609

GIL VICENTE 42. DIÁLOGO SOBRE A RESSURREIÇÃO (1535)

o centúrio

Resumo:

Dois rabinos conversam entre si. Um deles enuncia uma série de provérbios populares, aprendidos de pai, mãe, tio. “…quem chora ou canta, fadas más espanta… não comas quente, não perderás os dentes, quem não mente, não vem de boa gente, não achegues à forca, não te enforcarão”. Dois centuriões se juntam a eles e comunicam que o corpo de Cristo desapareceu, tendo ressuscitado como havia dito. Os rabinos não acreditam. Os centuriões enumeram os efeitos que a ressurreição fez com eles. Um ficou sem os cabelos, o outro sem os dentes e as unhas. Chega outro rabino e eles decidem que, se for verdade, calar-se-ão e negarão tudo. Anunciam que farão festas, para não darem a perceber que foram derrotados.

GV138. Levi (fala)

Que nos calemos em nosso calado:
… Que seja verdade, calar e negar.

(fala: Jorge Teles)

 

Comentário:

É uma peça muito curta, escrita num tom jocoso, satirizando os judeus, todavia sem menosprezá-los. A narração da ressurreição, vista pelo ângulo dos judeus. Como fez em muitos de seus autos, Gil Vicente moderniza a situação de ações antigas, falando de fatos ligados ao Portugal de seu tempo.

Visitas: 452

GIL VICENTE 41. AUTO DE MOFINA MENDES (1534)

a Virgem

Resumo:

Um Frade entra com um sermão cheio de citações, algumas sem nexo. Diz-se enviado para apresentar as figuras do Auto: a Virgem e suas criadas, Prudência, Pobreza, Humildade e Fé. As criadas têm livros e Maria pergunta a cada uma o que estão lendo. Elas enumeram diversas profecias sobre o nascimento de Cristo. Maria exclama: “Oh, se eu fosse tão ditosa que com estes olhos visse senhora tão preciosa, tesouro da vida nossa, e por escrava a servisse”.  Entra Gabriel e faz a ela a anunciação. Prudência, Pobreza, Humildade e Fé instruem sobre as respostas ao Anjo. Após este passo, fecha-se a cortina e a cena se desloca. Pastores estão entretidos em suas tarefas e entre eles Mofina Mendes. É desajeitada. Anuncia os desastres que aconteceram a todos os animais sob seus cuidados. É despedida e recebe um pote de azeite. Há o recantado relato sobre a sonhadora que ficará rica vendendo o azeite, comprando ovos, vendendo ovos, e casando-se. Quebra-se o pote e o devaneio termina. Mofina sai cantando. Chegam outros pastores e dormem. Segue-se a segunda parte do Auto natalino, que é uma “contemplação” da natividade. Virtudes conclamam ao louvor a todos e a tudo, incluindo os fenômenos da natureza. Maria pede que a Fé vá ao povoado e traga acesa a vela da fé. A Fé volta e diz que não conseguiu pessoa que a acendesse. Maria pede à Prudência que vá ao povo para acender a vela da esperança. José intercede e pede que ela desista de pedir luz às gentes. Prudência diz que não há necessidade de luz, pois que “o Senhor qu’ há de nascer é a mesma claridade”. Um Anjo canta para que os pastores acordem e adorem seu rei. Anjos tocam os instrumentos, as Virtudes cantam e os pastores dançam, saindo todos.

GV136. Mofina Mendes

Por mais que a dita m’engeite,
Pastores, não me deis guerra;
Que todo o humano deleite,
Como o meu pote d’azeite,
Ha de dar comsigo em terra.

(canta Carmen Ziege)

GV137. Anjo

Recordae, pastores!
Que vos levanteis.
Naceu em terra de Judá
Hum Deos so, que vos salvará.
Que vos levanteis.
Ah pastor! Ah Pastor!
Chama todos teus parceiros,
Vereis vosso Redemptor.

(canta Jaqueson Magrani)

 

Comentário:

Último auto natalino composto por Gil Vicente, uma peça madura e poética. Entre a anunciação e o nascimento, acontece a cena profana de Mofina Mendes.
Ao que tudo indica, alguns Autos separavam o sagrado do profano por meio de uma cortina. Alguns aconteciam em capelas, como o Auto dos Quatro Tempos. A anunciação feita por Gabriel é interessantemente dramatizada. Após cada palavra do Anjo, Maria pergunta a suas criadas o que deve responder e elas vão aconselhando suas respostas. A ave-maria acaba se transformando num lírico texto expandido.
Todo o texto da introdução, o prólogo dito pelo Frade, foi proibido nas edições de 1586 e 1624.

Visitas: 557