Rubaiat, de Omar Khayyam, de 121 a 135
traduzido por Matos Pereira. Editora Jangada, Rio de Janeiro, 1944.
CXXI
Senhor, puseste estorvos invisíveis
pelo nosso caminho, e decretaste:
– “Desgraça a quem tombar!” Mas tu bem sabes
que tudo vem de ti. Não nos criaste?
CXXII
Este arco imenso que nos cobre a todos
é uma lanterna mágica, onde a vela
é o sol, em torno ao qual passamos
e repassamos neste mundo – a Tela.
CXXIII
Nada mais somos que movente fila
de mágicas figuras, indo e vindo,
em torno dessa lâmpada do sol
que a mão de Allah sustenta – e ele sorrindo.
CXXIV
Então, erguendo a voz à bola azul,
eu perguntei: Que luz tinha o destino
para guiar quem tropeça pelas trevas?
– “Tem fé!” – ao longe badalou um sino.
CXXV
– “Allah é grande!” – o Muezin exclama
e esse grito parou a queixa ingente
que se eleva da Terra, qual gemido
ao Criador, que a olha – indiferente.
CXXVI
Tudo tem fim. Hoje Bagdá e Balk
jazem no pó. Rosas vão fenecer…
Bebe teu vinho, e olhando a lua, evoca
essas grandezas que ela viu morrer.
CXXVII
A lágrima me esconde o azul do céu
e o fogo dos infernos não é mais
que débil chama em face ao que me abrasa.
– E eu só desejo um momento de paz.
CXXVIII
Além da terra, além dos horizontes,
eu procurava o céu e o caos ardente
quando ouvi uma voz solene e triste:
– “Para, irmão! Olha introspectivamente.”
CXXIX
Fecha o Alcorão e pensa e fala e age
sem temor. Perdoa a quem te ferir.
Dá aos pobres metade do que tens
E esconde-te depois – para sorrir.
CXXX
Amanhã sobre a terra, um ser estranho,
não vê, não é infiel, rico nem pobre.
Indiferente a tudo – nada afirma.
Quem é esse homem tão altivo e nobre?
CXXXI
Se queres ter a solidão dos astros
foge de tudo a que este mundo infesta.
Não te debruces sobre dor alguma
nem participes de nenhuma festa.
CXXXII
Repete a experiência todo dia:
– “A vida é breve, é pó, é um sonho, é nada.
E tu não te assemelhas a uma árvore
que renasce, depois de ser cortada?”
CXXXIII
Contempla este regato no jardim
e acredita, como eu, que é de Kauçar.
E, estando, finalmente, entre os eleitos,
procura teu amor, para te amar.
CXXXIV
Por que te afliges, Fazedor de Tendas,
A “Culpa” foi por ti originada?
Deixa então de ser triste. Após a morte
ou tu terás misericórdia, ou nada.
CXXXV
Neste jogo monótono da vida
ganhas a dor, depois, sono profundo.
Feliz quem expirou quando nasceu.
E mais feliz, quem nunca veio ao mundo.