Rubaiat, de Omar Khayyam, de 136 a 150

Rubaiat, de Omar Khayyam, de 136 a 150

traduzido por Matos Pereira. Editora Jangada, Rio de Janeiro, 1944.

 

 

CXXXVI

Dúvida, convicção, erro e verdade

são como bolhas de ar, minha querida.

seja irisada ou baça, ela reflete,

nada mais, nada menos, do que a vida.

 

CXXXVII

A essa taça emborcada, sob a qual

rastejamos e à qual chamamos Céus,

não ergas mãos em súplica, pois ela,

tal como tu e eu, anda aos boléus.

 

CXXXVIII

Esconde minha dor, qual passarinho,

que, ferido, se esconde e vai morrer.

Traze-me vinho, rosas e a canção

De tua indiferença ao meu sofrer.

 

CXXXIX

Sempre que a dor e o pranto te aniquilem,

pensa num campo após a chuva – é lindo!

E quando a morte desejares, pensa

numa criança que desperta rindo.

 

CXL

As aparências, quase sempre, enganam.

Os beijos são frutinhas saborosas.

Mas, atenção, Allah nos deu o amor

como certas plantas venenosas…

 

CXLI

Silêncio, oh, minha dor, que um lenitivo

eu hei de achar, enfim, para viver.

Os mortos não têm mais memória alguma.

E, oh, meu amor, não quero te esquecer.

 

CXLIII

Eu pergunto a mim mesmo o que é que eu tenho

e após a morte, o que será do “Eu”.

A vida é breve, é chama, é cinza, e o vento

ao dispersá-la diz: “Alguém viveu.”

 

CXLIV

Se a nossa sorte aqui, é, simplesmente

sofrer,morrer, feliz quem foi aborto.

– E a alma que Allah deve julgar um dia?

– Isto precisas perguntar a um morto.

 

CXLV

Em breve instante, no areal do Nada

e ficas conhecendo o teu contento.

As estrelas se vão, e a caravana

atinge o seu ocaso num momento.

 

CXLVI

Mahmu, senhor de todas as vitórias,

a caterva feroz e alucinante

das dúvidas que afligem nossa alma,

destrói com sua espada flamejante.

 

CXLVII

A bola não consente nem protesta

mas vai e vem até que o jogo acabe.

No chão do mundo és bola do destino.

o indecifrável Ser que tudo sabe.

 

CXLVIII

A mão do tempo escreve e, tendo escrito,

passa além, e nem todo o teu pesar

corrigir pode meia linha, e nem

teu pranto, uma só letra, apagar.

 

CXLIX

Não é verdade que, através das eras

rola uma história, que, se não me engano,

conta que Deus pôs barro umedecido

dentro de um molde com semblante humano?

 

CL

Mandei minha alma através do Invisível

uma letra aprender, do nome “Eterno”.

Pouco depois, ela, voltando, disse:

– “Eu sou eu mesma, o próprio Céu e Inferno.”

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