conta outra vó 15. o enigma

O ENIGMA

       o enigma                                                

Nota: Historinhas em que o irmão mais novo, às vezes tido como bobo, leva a melhor, existem aos montes na literatura popular do mundo inteiro. Dentre as que eu conheço, a mais elaborada e mais poética é o maravilhoso relato bíblico da história de José. Historinhas em que um enigma é apresentado ao herói, sob pena de um grande castigo, em caso de erro, e com um grande prêmio, em caso de acerto, também são muito comuns. A de Édipo foi a que atingiu uma das mais altas expressões na literatura. Decifra-me ou te devoro, dizia a Esfinge aos passantes. Édipo desvendou o enigma, ganhou um reino com rainha e tudo, mas por trás dessa vitória o destino o premiava com a trágica fatalidade que ele acreditava estar evitando.
    Este pequeno conto de minha vó é parecido com a vida que ela viveu; ingênuo, humilde, despretencioso. O relato mínimo, expurgado de devaneios, imagens poéticas ou elucubrações sobre o destino humano. A simplicidade absoluta, para crianças que estão começando a compreender o mundo.

    Era uma vez três irmãos. O mais velho, o do meio e o mais pequeno. Tudo que os dois grandes queriam fazer, o pequeno também queria mas ele era meio abobalhado e atrapalhava tudo e os irmãos batiam nele e passavam pito.
    Uma vez os dois irmãos resolveram ir na cidade porque a princesa ia falar um enigma e quem adivinhasse ia casar com ela e ganhar a metado do reino. Mas, se não acertasse, ia ficar escravo no palácio.
    Aí o caçula disse que também ia. Os irmãos brigaram muito e falaram pro pai que ele ia atrapalhar tudo e que não queriam ter que cuidar de um irmão abobalhado.
    Mas o pequeno tanto tez e tanto fez, que o pai deixou e os três se foram.
    Aí os dois iam andando na frente e o caçula ia atrás. E qualquer coisinha que ele via ele parava e chamava:
    – Manos, olhem o que eu achei.
    E os irmãos ralhavam:
    – Bobo bobo, não podemos nos atrasar.    
    Aí o pequeno achou um ninho de passarinho com três ovinhos.
    – Manos, olhem o ninho que eu achei com três ovinhos.
    Os irmãos ralharam:
    – Bobo bobo, não podemos nos atrasar.    
    Aí ele pegou os ovinhos e guardou no bolso.
    Daí a pouco, ele achou um pauzinho.
    – Manos, olhem o pauzinho que eu achei.
    Os irmãos ralharam:
    – Bobo bobo, não podemos nos atrasar.    
    Aí ele guardou o pauzinho no outro bolso.
    Daí a pouco, ele achou uma bostinha de vaca.
    – Manos, olhem a bostinha que eu achei.
    Os irmãos ralharam:
    – Bobo bobo, não podemos nos atrasar.    
    Aí ele guardou a bostinha no bolso da camisa e chegaram ao palácio.
    Era um de cada vez e ninguém tinha acertado o enigma da princesa.
    Aí o irmão mais velho foi e errou. Foi o outro e errou. E foi o caçula.
    Ele entrou na sala e viu a princesa. Ela gritou assim:
    – Estou com fome!
    Ele mostrou os ovinhos e disse:
    – Frita estes três ovinhos.
    – Não tenho com que mexer!
    Ele mostrou o pauzinho e disse:
    – Mexe com este pauzinho.
    – Ah, vai à merda!
    Ele mostrou a bostinha e disse:
    – Tome!
    Aí ele casou com a princesa e tirou os irmãos do cativeiro e foram felizes para sempre.

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