Rubaiat, de Omar Khayamm, 31 a 45

Rubaiat, de Omar Khayamm, 31 a 45

traduzido por Matos Pereira. Editora Jangada, Rio de Janeiro, 1944. 

 

XXXI

Nada mais é que a tenda onde repousa

um rei que vai cumprir o árduo destino.

Ergue-se o Rei, abate-o a negra Morte

e limpa a tenda à espera do inquilino.

 

XXXII

Um falso instante – e então, no palco humano,

se desenrola o dramalhão da fraude

que, para diversão da eternidade,

o próprio Allah engendra, encena e aplaude.

 

XXXIII

Que importa a mim, o que perdido eu tenha

por ter seguido a trilha que escolhi?

Dizem que Allah me perdoará – recuso

este perdão que nunca lhe pedi.

 

XXXIV

Rápidos como o vento no deserto,

velozes como as águas da corrente

os dias passam, mas ao Amanhã

e ao Ontem me conservo indiferente.

 

XXXV

Pergunta o povo se eu reduzir pude

o Ano à expressão mais simples – não. Porém,

já consegui riscar do calendário

o Ontem que foi e o Amanhã que vem.

 

XXXVI

Vais tu passar o resto da existência

buscando a chave do segredo – oh, lida!

Um fio só divide o bom do falso.

Não é de um fio que dependa a vida?

 

XXXVII

Talvez as gotas que nós derramamos

Beba-as a terra, e pelos seus arcanos

vão extinguir a dor nuns olhos tristes

que lá se escondem, Deus, há tantos anos!

 

XXXVIII

Céu é a visão das ânsias realizadas.

Inferno é a sombra da alma em dor premente,

atiradas às trevas – de onde nós,

mal saímos – voltamos novamente.

 

XXXIX

Quando eu morrer, não haverá mais rosas,

crepúsculos e sóis, orvalho e vento;

o mundo, então, se acabará também

pois sua vida é o nosso pensamento.

 

XL

Pois se a alma pode, despojando a argila,

erguer-se nua e livre pelos ares,

seria um crime, tê-la presa ao barro

que a aperta e expõe a todos os azares.

 

XLI

O que disseram santos e letrados

queimados na fogueira pelo povo,

nada mais são que histórias inventadas,

entre o acordar e o adormecer de novo.

 

XLII

Não temas que, encerrada a nossa conta,

não mais se veja aqui outras iguais.

Deus vem lançando pela Eternidade,

milhões de bolhas como nós, ou mais.

 

XLIII

É um jogo de xadrez – há noite e há dia –

onde nós sendo as peças, temos baixas.

O Destino nos move, humilha e mata,

e depois, um por um, devolve à Caixa.

 

XLIV

Senhor, tu que do pó tiraste o homem

e o Édem, com a serpente, entretiveste,

perdoa-nos o mal que nós fazemos

como perdoamos o que nos fizeste.

 

XLV

Como? Exigir que o mísero te entregue

ouro de lei, quando emprestaste escória.

Querer que ele te pague o que não deve

nem podia dever – como é essa história?

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