Rubaiat, de Omar Khayyam, de 151 a 165
traduzido por Matos Pereira. Editora Jangada, Rio de Janeiro, 1944.
CLI
Se olhas, debalde, para o chão da Terra
E aos Céus levantas teu olhar a esmo,
hoje que tu és tu, como há de ser
quando amanhã não fores mais tu mesmo?
CLII
Não é curioso, que, nenhum daqueles
que antes de nós passou o negro Umbral,
jamais voltou para falar da estrada,
que, para conhecer, só sorte igual?
CLIII
Depois que nós passarmos esse Véu,
muito depois, haverá ainda o Mundo
que liga, tanto a nossa vinda e ida
quanto dois grãos de areia, o mar profundo.
CLIV
Ergui as mãos e, tateando as trevas,
em vão busquei a lâmpada, não nego.
Então o Tu em Mim, atrás do Véu
disse: – “Procura no Eu em Ti, ó cego!”
CLV
Quer seja em Nayshapur ou Babilônia,
e tua existência, alegre ou aborrecida,
escoa-se o teu sangue, gota e gota,
caem, uma a uma, as pétalas da Vida!
CLVI
Amor, se o Fado, o esquema deste mundo
nos revelassse, como um livro aberto,
iríamos, sem dó, destruí-lo, para
remodelá-lo, de nossa alma perto.
CLVII
Olha, Lua de Amor, que não desmaias,
de novo se ergue a outra, na amplidão:
quantas vezes, depois, não se erguerá
para me ver neste jardim – em vão!
CLVIII
E quando penetrares, descuidosa,
no Jardim da Memória, ao fim do dia,
se, em teu passeio, fores onde eu durmo,
verás, Amor, que a taça está vazia.
CLIX
O vento sul despetalou a rosa
que ontem encantara o terno rouxinol.
Quando as rosas murcharem no teu rosto
outras, decerto, se abrirão ao sol.
CLX
Eu não pedi para viver, no entanto,
tomo da vida o que lhe apraz me dar.
Sem lamento, sem lágrima ou protesto,
eu partirei também, sem me queixar.
CLXI
Allah não quer saber se és bom ou mal.
Na festa, empunha sempre a maior taça,
colhe todos os frutos desta vida
e não te esqueças que o momento passa.
CLXII
Enganar ou mentir, eu não procuro.
Porém o vinho eu sempre procurei
E vivo para o instante que desliza
pois Hoje é meu mas Amanhã não sei.
CLXIII
Nossos amigos, onde estão? Quem sabe?
Acaso a Morte os derrubou na lida?
Ainda lhes ouço os cantos na taverna.
Cantos de morte ou de ebriez da Vida?
CLXIV
Confia nele e tu terás calor.
Te livrarás das neves do passado.
Penetrarás nas brumas do futuro
e serás, finalmente, libertado.
CLXV
Deus tira a força da fraqueza humana
e nós juramos, com o mesmo ardor,
o Verdadeiro e o Falso; porém, eu,
tenho a desculpa da embriaguez do Amor.