Rubaiat, de Omar Khayyam, de 106 a 120

Rubaiat, de Omar Khayyam, de 106 a 120

traduzido por Matos Pereira. Editora Jangada, Rio de Janeiro, 1944.

  

CVI

Não deixes teu saber magoar os outros.

Vence-te e à tua cólera também.

E terás paz se, em te ferindo a sorte,

tu gargalhares, sem ferir ninguém.

 

CVII

Pediu-me o coração: Sábio Khayyam,

instrui-me! Eu disse-lhe “A”. Então, num grito,

responde o coração: “Basta, eu já sei.

Um é a primeira cifra do Infinito.”

 

CVIII

Dizem que Deus deu vida a este universo

e o destruirá no tal Dia Tremendo.

De quem é a culpa se este mundo é horrível?

Responda, quem souber. Eu não compreendo.

 

CIX

Sono na terra e sob  a terra sono;

e no pó quantos corpos estendidos.

Ao Deserto do Nada uns homens chegam,

sucessores em breve sucedidos.

 

CX

Indiferente ao sábio, a terra gira…

Nos astros, tu não podes habitar…

Antes medita sobre a Morte –  os vermes

ou os cães vadios te hão de devorar.

 

CXI

Eu não receio a negra e treda Morte;

a Vida, sim, veloz, incerta, intensa.

Bem que ma deram sem que eu lhes pedisse,

e que restituirei com Indiferença.

 

CXII

Deixa o sábio sozinho, resolvendo

a Queixa Universal. Comigo vem,

e num recanto da Babel, deitado,

zomba de zombar de ti, também.

 

CXIII

Eu tive professores eminentes

que notaram em mim muito talento.

Mas tudo que aprendi e ainda aprendo

é fumaça à mercê de qualquer vento.

 

CXIV

O mundo, um grão de areia pelo espaço;

toda a ciência dos homens, patacoada.

gerações, animais e flores – sombra.

E o resultado de tudo isto – é nada!

 

CXV

Ah! Pesa os teus amigos na balança

e a eles não confies tua alegria;

vê antes de estreitar a mão de um homem,

se ela é capaz de te ferir um dia.

 

CXVI

Derviche, despe o teu suntuoso manto

e enverga, da pobreza, o traje honesto;

ninguém te saudará, mas em teu peito,

cantarão serafins – que importa o resto?

 

CXVII

Jamais resolverás um só problema

de todos estes, que a existência encerra.

Se tua crença te promete um Édem,

constrói o teu agora – sobre a Terra.

 

CXVIII

Deus, fizeste o céu cheio de estrelas

mas te excedeste em modelar a dor,

com lábios de rubis, cabelos de ouro,

quantas fizeste, quantas, meu Senhor!

 

CXIX

O mundo é como esses palácios tristes

onde muito Jamshy viveu amando,

e sonharam com glória cem Bharano,

para acordar depois, todos chorando.

 

CXX

Se és infeliz, esquece que tu sofres

e não sofrerás mais. Ao teu pesar

imola uma mulher, de seios níveos

que não ames e não te queira amar.

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