Rubaiat, de Omar Khayyam, 1 a 15

Pequena introdução.     

 

          desde que comecei, há nove anos, a publicar meus trabalhos neste saite, pela primeira vez, passo a publicar uma obra alheia.

          tenho textos alheios, que traduzi ou musiquei, e um trabalho meu traduzido para o Esperanto, por Geraldo Mattos. todos os outros são inteiramente de minha lavra.

          quando eu tinha entre quinze e dezesseis anos, apareceu na minha casa o livro Rubayat, de Omar Khayyam. teria pertencido à Biblioteca da Escola Naval, onde trabalhavam duas de minhas irmãs? não sei. sei que fiquei tão fascinado com o livro, que o copiei inteiro. infelizmente, por conta da inexperiência e do desconhecimento sobre direitos autorais e algumas mazelas acadêmicas, não copiei a introdução, o nome da Editora, a data da edição e nem o nome do tradutor.

          com o advento da Internet, passei a procurar com frequência a exata tradução que eu tinha, já que ao longo dos anos fui conhecendo diversas, em prosa ou verso. nenhuma tinha, para mim, o que eu encontrara no meu texto copiado: o sabor das quadrinhas populares de Portugal e do Brasil, certeiras, singelas, quase descuidadas, mas que sempre passam a essência do pensamento do autor. todas as outras, ou quase, são, a meu ver, pretensiosas, cheias do que eu chamo de literaturice. o autor se aproveita de texto alheio para, na tradução, exibir um virtuosismo burro e artificial. sempre estive mais para Monteiro Lobato do que para José de Alencar. quem tem o que dizer não precisa enfeitar.

          recentemente encontrei um volume num sebo do Rio de Janeiro. a publicação é de 1944. da Editora Jangada, no Rio de Janeiro. e o tradutor, Matos Pereira.

          como meu saite não tem objetivos comerciais, vou passar a publicar as famosas quadrinhas de Khayyam.

     são 181 quadrinhas. vou mostrá-las aos poucos, de quinze em quinze. 

          e, ao final, pretendo apresentar comentários e esclarecimentos sobre o autor e sua obra, em torno do quê, existe uma quantidade enorme de fantasia e desinformação.

 

 

Rubáiat

 

Omar Khayyam

 

(Pérsia, atual Irã, 1048-1131)

 

 

I

Desperta! O dia, na noturna taça

jogou a pedra que afugenta estrelas;

e o Caçador do Oriente, em nós de luz,

prendeu as torres do sultão – sem vê-las.

 

II

E quando o galo canta, os que ante a porta

se acham, põem-se a gritar: Abre, rapaz,

tu sabes que não temos muito tempo,

e uma vez idos – nenhum volta atrás.

 

III

O ano novo traz velhos desejos

e leva o triste à solidão da serra

onde a mão branca de Moisés se estende

e suspira Jesus, dentro da terra.

 

IV

Nesta estação de flores e perfumes,

cheia de amor, de paz, de canto e luz,

será o lírio a dextra de Moisés?

e será a brisa o sopro de Jesus?

 

V

Olha, mil flores despertaram hoje

e mil jazem no pó – aqui e além.

E este mês de verão que traz a rosa,

leva Jamshy e Kaikobá também.

 

De acordo com o grande poeta Ferdowsi Shahnama, Jamshy foi o quarto rei do mundo. Ele dominava sobre todos os anjos e os demônios e o mundo; foi também soberano e sacerdote supremo da Hormozd. Possuiria uma taça prognosticadora, cujos sete círculos simbolizavam os sete planetas e os sete mares. Nela se continha o elixir da vida.

Kaikobá, rei guerreiro da Pérsia, semi-histórico.

 

VI

Mas vem com o velho Omar, e deixa a sorte

de Kaikobá e Kaikhosru, no olvido.

que se zangue Ruystum e que Hatin Tai

grite pelo jantar, não dê ouvido…

 

Kaikhosru, rei lendário pérsico.

 Ruystum, guerreiro lendário, conhecido poor suas grandes façanhas.

 Hatin Tai, poeta maometano, bastante conhecido por sua franca generosidade.

 

VII

Vamos pelo gramado que separa

a “Terra de Ninguém” da que tem dono:

onde cada um é livre, onde a ave canta,

e choremos Mahmude no seu trono.

 

VIII

Aqui, com alvo pão, sob esta fronde,

com vinho e versos – e contigo, amor,

ao mesmo lado, cantando no deserto,

mesmo o deserto é um paraíso em flor.

 

IX

Com água e pão, sob esta verde fronde,

e vendo o amor que em teu olhar existe,

nenhum sultão é mais feliz do que eu.

Mendigo algum, também, não é mais triste.

 

X

“Doce é o poder mortal” – pensam alguns,

outros: “o Paraíso é fascinante.”

Agarra-te ao que tens, e deixa o resto.

Que vale o toque de um tambor distante?

 

XI

Olha a rosa que em torno a nós viceja.

“Rindo”, ela diz, “para este mundo eu vim.

Mas quebrem-me o cordão da minha bolsa

e o meu tesouro fica no jardim.”

 

XII

A esperança em que tanto confiamos

vira cinza ou prospera; porém, ai!

como a neve no tórrido deserto,

explende uma hora, duas… e se esvai.

 

XIII

Aqueles que o grão de ouro cultivaram

e os que o lançaram, sem pensar, aos ventos,

jamais se tornarão em áurea poeira

pois o sepulcro é surdo aos seus lamentos.

 

XIV

Pensa: nesta estalagem toda em ruínas,

cujos portais são o poente e a aurora.

sultão após sultão, com tanta pompa,

se hospedou um momento, e foi-se embora.

 

XV

Ouvi dizer que o leão e a lagartixa

moram nos paços do sultão vencido.

E o asno selvagem escava onde ele jaz.

E ele – profundamente adormecido.

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